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Medir apenas o que é relevante

ago. 10, 2023

Este conteúdo foi produzido por Maria Cecília Prates

Há um paralelo entre, por um lado, o Marco Lógico e a Teoria da Mudança e, por outro lado, os OKRs (do inglês Objectives and Key Results). Os primeiros são ferramentas muito usadas na área social, e o segundo ferramenta importante na área de empresas e negócios. Ambas começaram a ganhar espaço a partir da década 1970 em contraposição a um modo de gestão que era baseado na hierarquia vertical e no controle de processos e atividades.


No (meu) último artigo aqui do Portal eu comentei sobre a implementação da Teoria da Mudança. Agora nesse artigo irei comentar sobre o livro de John Doerr, Measure what Matters  (Medir só o que é relevante), que foi lançado em 2018 e mostra justamente, a partir de depoimentos de um grupo de grandes empresas que ele assessorou com a metodologia, as consequências positivas da gestão baseada em resultados acordados de modo participativo.


Recomendo a leitura do livro para os gestores de ONGS (no original) ou em (em português). O livro confirma e reforça a importância de ter objetivos claros e definidos de forma participativa, com relação de causa-e-efeito entre eles, e de definir indicadores que sejam poucos e relevantes de modo a (só) acompanhar o que realmente importa.


O livro


O livro Measure What Matters tem apresentação de Larry Page, co-fundador da Google, que começa por dizer que não faz apresentações de livros. Mas que aceitou fazer essa apresentação “porque (o autor) John Doerr deu um tremendo presente ao Google em todos esses anos. Os OKRs nos ajudaram a crescer 10 vezes mais em vários momentos. Nos ajudaram a tornar viável a nossa missão loucamente corajosa de  “organizar as informações do mundo”. Foram os OKRs que me mantiveram e ao restante da Companhia dentro dos prazos e no caminho certo, quando mais precisávamos. E eu quero muito que as pessoas ouçam o que ele tem a dizer”.

OKRs é a abreviatura para Objectives and Key Results (Objetivos e Resultados-Chave). Para o autor John Doerr, o pai dos OKRs foi Andy Grove, um dos fundadores e presidente da INTEL por vários anos. Outras personalidades também abordaram o tema, como Frederick Taylor e Henry Ford na 1ª metade do século XX; e também Peter Drucker, esse último conhecido como o criador da APO (Administração Por Objetivos) a partir do seu livro clássico, The practice of management.


Dos anos 1960 até 1990, muitas empresas passaram a adotar a gestão por objetivos (APO, de Peter Drucker), e os equívocos de implementação foram se tornando cada vez mais evidentes. Os objetivos eram planejados centralmente e empurrados hierarquia abaixo. Em outros casos, eles ficavam estagnados por falta de atualização frequente; ou presos e restritos a alguns poucos “silos” (grupos); ou reduzidos aos KPIs (Key Performance Indicators) que não passavam de números sem alma e sem contexto. E o pior ainda era quando o desempenho vinha atrelado a salário e bônus. Como observa Doerr, se correr risco poderia ser penalizado, por que alguém iria querer se arriscar? No final dos anos 90 o método caiu em descrédito, e o próprio Drucker já o considerava como “apenas mais uma ferramenta, e não a grande cura para as ineficiências da gestão”.

No entretanto, pode parecer contrassenso mas foi em 1999, com o método da APO já fortemente desacreditado, que John Doerr conquistou Larry Page e os outros sócios da Google para o uso das OKRs na companhia, tendo por base a sua experiência na Intel onde o seu mestre fora Andy Grove.


Depois da Google, muitas outras empresas do setor de tecnologia também foram sendo conquistadas para o método, setor em que agilidade e trabalho em equipe são imperativos. Ao longo do livro, Doerr cita vários exemplos de casos de empresas adotantes, como as grandes do Vale do Silício (AOL, Drop-box, LinkedIn, Oracle, Slack, Spotify, Twitter), ou as grandes fora do Vale (BMW, Disney, Exxon), ou pequenas startups, ou ainda do setor não-lucrativo como a Fundação Bill & Melinda Gates.


Logo na introdução, Doerr explica que os OKRs representam um protocolo colaborativo para definir objetivos para empresas, equipes e indivíduos. Ou seja, representam uma metodologia de gestão que ajuda ou garante que todos da empresa concentrem os seus esforços nas mesmas questões relevantes.


E o autor vai além, "um objetivo é simplesmente O QUE é para ser atingido, nada mais e nada menos. E por definição, objetivos devem ser significativos, concretos, orientadores de ações e (idealmente) inspiradores. Quando desenhados e implementados adequadamente, funcionam como vacina contra o pensamento e a execução difusos.".


Já os Key Results (ou Resultados-Chave) monitoram e servem como referência para o COMO chegar ao objetivo. Objetivos-Chave efetivos são específicos e referenciados no tempo, agressivos porém realistas. A maior parte deles é mensurável e verificável. Na maioria das vezes, o ideal é ter entre 3 a 5 resultados-chave por objetivo; pode ser tentador incluir um número maior, mas é um erro.


O livro está dividido em duas seções complementares. A primeira aponta os quatro superpoderes dos OKRs, que são:


  • Foco e comprometimento com prioridades;
  • Alinhamento e conexão com o trabalho das equipes;
  • Busca da prestação de contas;
  • Esticar ao máximo o limite do possível, e ter liberdade para fracassar


Já a segunda seção trata das aplicações e implicações das OKRs para o novo mundo do trabalho, a saber:


  • Gestão continuada de desempenho: os sistemas de avaliação de desempenho, seja anual (APO) ou mesmo trimestral (OKR), correm o risco de se tornarem obsoletos. É preciso um novo modelo de RH (Recursos Humanos) adaptado aos novos tempos, baseado em Conversações (constantes); Feedbacks (em tempo real); e Reconhecimento (dos pares, baseado em critérios claros, e vinculado aos objetivos e estratégia da organização);
  • Melhora contínua da implementação do método, estendida a todas as áreas da organização;
  • Implementação facilitada da cultura da mudança (exemplifica com o caso do uso dos OKRs pela banda de Bono Vox, que serviu para nortear o trabalho do grupo para salvar vidas na África)


Para concluir, eu ainda destaco algumas das citações utilizadas pelo autor (na seção 1 do livro), que traduzem muito bem o espírito do livro, que é o de medir apenas o que for realmente relevante.


  • Se você não sabe aonde você está indo, você pode não chegar lá (Yogi Berra)
  • Ter ideias é fácil. A execução é tudo (Mantra de John Doerr)
  • Existem muitas pessoas trabalhando tanto e alcançando tão pouco (Andy Grove)
  • Menos é mais. Um limite de 3 a 5 resultados-chave por objetivo nos leva a escolher o que realmente é importante (Andy Grove)
  • As empresas ruins são destruídas em tempos de crise. As boas companhias sobrevivem às crises. As grandes companhias se aproveitam delas (Andy Grove fazendo referência ao caso dos microprocessadores da Intel em 1986)
  • São as nossas escolhas …. que mostram quem nós realmente somos, muito mais do que as nossas habilidades (J.K. Rowling)
  • Não permita que a perfeição seja o inimigo do bom (Voltaire)
  • Inovação significa dizer não para mil coisas (Steve Jobs) Daí o fato de ter muitos objetivos pode obscurecer o foco do que realmente conta.
  • Nós não empregamos pessoas inteligentes para dizer a elas o que devem fazer. Nós empregamos pessoas inteligentes para que elas nos digam o que fazer. (Steve Jobs)
  • Em Deus nós acreditamos; todos os outros devem apresentar dados (W. Edwards Deming)
  • Se a escada não está apoiada na parede certa, todo o degrau que subimos está nos levando mais rápido para o lugar errado (Stephen Covey)
  • A gente não aprende da experiência ….. a gente aprende da reflexão sobre a experiência (John Dewey)
  • O maior risco de todos é não assumir riscos (Mellody Hobson)



Maria Cecília Prates é economista e mestre em economia pela UFMG, e doutora em administração pela FGV /Ebape (RJ). A área social sempre foi o foco de suas pesquisas durante o período em que esteve como pesquisadora na FGV, e depois em seus trabalhos de monitoria, consultoria, pesquisa e voluntariado. 


Contato: mcecilia@estrategiasocial.com.br


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De acordo com o pesquisador brasileiro Ewerton Naves Dias, Ph.D em Psicologia pela Universidade do Porto, no Coping , consideramos o estresse como algo contextual, “o que significa que se trata de um processo de relação entre a pessoa e o ambiente e que se transforma ao longo do tempo. Desse modo, ele é definido como uma situação avaliada pelo indivíduo como significativa e com demandas que excedem seus recursos para lidar com o respectivo evento”. Diferente dos mecanismos de defesa, que acontecem de forma inconsciente, as estratégias de enfrentamento utilizam-se da percepção da pessoa frente ao evento estressor, desencadeando pensamentos avaliativos sobre suas ferramentas internas e externas e o controle ou não da situação, a fim de escolher sua forma de lidar com a situação. Categorias ou possibilidades de enfrentamento Apesar de Lazarus e Folkman definirem as duas principais categorias de enfrentamento, podemos encontrar na literatura algumas variações dessas estratégias, sendo as mais comuns: 1) Enfrentamento com foco no problema: Quando acredita-se que é possível alterar aspectos do ambiente, diminuindo ou eliminando os fatores de estresse e atuando de forma ativa. Alguns exemplos de ações, baseadas no contexto organizacional do Terceiro Setor, são: Análise crítica e detalhada do problema gerador de estresse Conversas individuais com pessoas que estão diretamente envolvidas na situação Conversas em grupo ou equipe, caso seja uma questão que influencie o bem-estar de várias pessoas Planejamento e criação de resoluções coletivas de enfrentamento ao problema Busca de apoio externo de especialistas 2) Enfrentamento com foco na emoção: Baseado na crença de que o ambiente é pouco alterável ou imutável, o indivíduo busca recursos para lidar com os sentimentos derivados do estresse, de forma a prolongar sua permanência na situação até que as circunstâncias mudem. Este é um tipo de enfrentamento moderado e pode ser realizado com: Fortalecimento de técnicas de autocontrole emocional Busca de apoio social (inclusive de colegas de equipe) ou psicológico para a descoberta de novas possibilidades de enfrentamento Investimento em hobbies ou atividades de lazer que minimizem os sentimentos negativos e promovam distração Desenvolvimento de práticas espirituais ou religiosas 3) Enfrentamento evitativo: Esta estratégia considerada passiva, também fundamentada na crença de que não há controle sobre as circunstâncias, engloba o afastamento, fuga, esquiva ou desligamento mental do problema. Aqui a pessoa escolhe evitar o conflito, lidar com os sintomas do estresse e economizar energia emocional. Qual estratégia usar? Os estudos que avaliam a predominância e a eficácia da utilização de cada tipo de coping divergem de acordo com o público pesquisado, considerando, no entanto, a variabilidade dos diferentes tipos de personalidade. Por exemplo: Uma análise feita com trabalhadores de CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) em Campinas (ZANATTA, 2019), verificou que a estratégia mais utilizada pelos profissionais destes espaços foi a de resolução de problemas, onde há a elaboração de planos de ação e alternativas com o objetivo de resolução da situação. Pesquisas realizadas com profissionais da saúde que trabalham em hospitais e analisadas pela Profª Drª Liliana Antoniolli (2022), afirmam que o coping mais utilizado pelas entrevistadas eram os baseados no enfrentamento com foco na emoção, onde empregavam um esforço cognitivo para ressignificar as experiências laborais “controlando emoções, como tristeza, medo e estresse, que emergem devido a situação conflitante”. Observa-se que a tendência de utilização de cada estratégia está positivamente ligada à experiência e idade dos profissionais, sendo que, quanto maiores mais o profissional tenderia a utilizar o enfrentamento com o foco no problema, enquanto os mais jovens tendem a escolher com mais frequência o afastamento (ou evitação) do estressor, por meio de um isolamento autoimposto. Outra proposta de estratégias de coping defendida pelo pesquisador Caryl Rubust (1988), da Vrije Universiteit em Amsterdã , Holanda , destacou outras quatro alternativas de enfrentamento, relacionadas ao ambiente de trabalho, que ele chamou de EVLN (Exit/Voice/Loyalty/Neglect), traduzido para o português como: saída, voz, lealdade e negligência. Nelas, o indivíduo escolheria: Saída: Sair do trabalho e encontrar um emprego melhor Voz: Tentar melhorar a situação conflitante com a sua voz Lealdade: Ser motivadas a apoiar ativamente a organização, ignorando seus incômodos Negligência: Concentrar-se em seus interesses não relacionados ao trabalho e "negligenciar" sua situação de trabalho insatisfatória De acordo com Lazarus e Folkman, as Estratégias de Enfrentamento ainda podem ser Adaptativas ou Desadaptativas, ou seja, quando as estratégias utilizadas são saudáveis e conseguem minimizar os sentimentos desagradáveis e desmotivadores são consideradas positivas/adaptativas. Em contraponto, quando não são saudáveis (recorrer a um vício como o cigarro, drogas ou bebidas alcoólicas, por exemplo) a estratégia é considerada negativa/desadaptativa. Como o Terceiro Setor tem lidado com os sintomas de estresse? Na “Pesquisa - A Saúde Mental e o Bem-Estar dos profissionais do Terceiro Setor ”, publicada pela Phomenta, em 2023, foram utilizados alguns questionamentos quanto às estratégias que as pessoas entrevistadas usavam para lidar com os sintomas de estresse oriundos do trabalho nas organizações sociais brasileiras, e encontramos nos resultados que: 69% relataram realizar atividades físicas 66% procuraram ajuda profissional de psicólogos, psiquiatras ou outros tipos de terapias alternativas 20% fazem uso regular de medicamentos calmantes e/ou ansiolíticos Percebemos com esses dados, que a maior parte das estratégias utilizadas pelos respondentes da pesquisa são do enfrentamento com foco na emoção, o que pode amenizar temporariamente a angústia e a desmotivação de quem passa por estresse de forma recorrente, mas que a médio prazo acaba gerando a saída deste colaborador, o que podemos observar nas altas taxas de rotatividade do setor. As Profª Drª Mary Sandra Carlotto e Sheila Gonçalves Câmara da Universidade Luterana do Brasil - ULBRA/Canoas, em suas pesquisas na área da educação, concordam com a constatação de que as estratégias de coping focadas no problema são estratégias adaptativas (positivas) que auxiliam os profissionais a enfrentar os problemas que surgem em seu ambiente organizacional. Elas também acrescentam que esse estilo de enfrentamento pode levar a um aumento dos níveis de realização profissional. Apesar de várias organizações sociais no Brasil relatarem, na Pesquisa da Phomenta (2023), que já estão implementando ações para amenizar os sintomas de estresse de seus colaboradores, como apoio psicológico, momentos de confraternização e lazer, formações e palestras, dentre outras, e estarem discutindo temáticas relacionadas à saúde mental e ao bem-estar, as mesmas ações precisam de coerência prática para realmente efetivar uma melhora da saúde coletiva. A publicação ressalta: “[...] é crucial que a organização não apenas introduza tais medidas, mas também promova mudanças que abordem os causadores de estresse, como o excesso de demanda e prazos apertados. A saúde mental não é apenas sobre discutir ou promover a conscientização, é também sobre criar um ambiente de trabalho sustentável onde os trabalhadores se sintam apoiados em suas rotinas diárias. Quando a liderança trabalha horas excessivas e perpetua um senso de urgência, por exemplo, isso pode enviar uma mensagem contraditória à equipe, sugerindo que, apesar das iniciativas de bem-estar, a cultura de trabalho exaustivo ainda prevalece”. Autoavaliação Como enfatizado no início do texto, o coping tem como característica principal a escolha consciente de sua reação frente ao estresse, o que nos leva a crer que para ser feita da forma mais eficaz, deve ser percebida, avaliada e monitorada com o passar do tempo. Dessa forma, faça agora uma autoavaliação de quais têm sido suas escolhas frente aos desafios do dia-a-dia, principalmente relacionados ao trabalho no Terceiro Setor. Avalie também quais têm sido as formas de enfrentamento utilizadas pelas pessoas em sua equipe ou em sua organização, para que se certifiquem de que por meio do apoio mútuo possam criar formas de lidar com o estresse enfrentando o problema. Referências Antoniolli, Liliana; Vega, Edwing Alberto Urrea Vega; Haack, Pâmela; Duarte, Andrey Godoy; Macedo, Andréia Barcellos Teixeira; Souza, Sônia Beatriz Cócaro de; Coping dos profissionais da enfermagem: revisão integrativa de literatura. Open Science Research - ISBN 978-65-5360-055-3 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 CARLOTTO, Mary Sandra; CÂMARA, Sheila Gonçalves. Síndrome de Burnout e estratégias de enfrentamento em professores de escolas públicas e privadas. Psicologia da Educação, vol. 26, n. 1, p. 29-46, 2008. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-69752008000100003 . Acesso em: 08 mar. 2023. DIAS, Ewerton Naves; PAIS-RIBEIRO, José Luís. O modelo de coping de Folkman e Lazarus: aspectos históricos e conceituais. Rev. Psicol. Saúde, Campo Grande , v. 11, n. 2, p. 55-66, ago. 2019 . Disponível em < http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2177-093X2019000200005&lng=pt&nrm=iso >. acessos em 10 mar. 2024. http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v11i2.642. Lazarus, R., & Folkman, S. (1984). Stress appraisal and coping. New York: Springer. PHOMENTA. Pesquisa: A saúde mental e o bem-estar dos trabalhadores do terceiro setor. Campinas: SP. 2023. Disponível em: https://www.phomenta.com.br/pesquisa-saude-mental-e-bem-estar RUSBULT, C. E.; FARREL, D.; ROGERS, G. e MAINOUS III, A. G. (1988), «Impact of exchange variables on exit, voice, loyalty and neglect: an integrative model of responses to declining satisfaction». Academy of Management Journal, vol. 31(3), pp. 599-627. Zanatta AB, Lucca SR, Sobral RC, Stephan C, Bandini M. Estresse e coping entre trabalhadores de centros de atenção psicossocial do interior do estado de São Paulo. Rev Bras Med Trab.2019;17(1) DOI:10.5327/Z1679443520190300:83-89 Coping: estratégias para enfrentar períodos estressantes ou Coping: mais saúde mental em períodos estressantes ou Coping, estratégias de saúde mental em períodos estressantes
Por Maria Cecília Prates   14 mar., 2024
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