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Como qualquer ONG pode usar o abatimento de impostos para atrair doadores

out. 28, 2021

Este conteúdo foi produzido por Marcos Pinheiro
 

Imagine falar para uma grande empresa que ela pode doar para sua ONG e abater o valor do imposto devido. Um sonho, né?

Saiba que isso é possível!

No Brasil, há mecanismos chamados “Leis de incentivo”, que possibilitam que empresas e indivíduos doem e depois abatam o valor doado dos impostos. Falamos sobre elas nesse post.


A grande maioria destas leis é focada apenas em determinadas causas. A Lei Rouanet, por exemplo, a mais antiga e conhecida delas, funciona apenas para projetos culturais. 


Porém, há uma lei que funciona para TODAS as causas. E é sobre ela que quero falar aqui.


Esta lei é pouco conhecida, principalmente por ser muito recente. Mas pode ser muito útil se sua organização souber usá-la bem.


Vamos conhecê-la um pouco melhor? 


Alerta: o texto é um pouco técnico, mas no final tem um passo-a-passo para você AGIR a partir da informação 😉.


Que lei é essa?


A primeira lei de incentivo geral do Brasil – não focada em uma causa específica – surgiu ainda na década de 90.


A Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, alterou a legislação do imposto de renda de modo a possibilitar a dedução de imposto caso a empresa fizesse doações para entidades civis, sem fins lucrativos, que prestassem serviços gratuitos em benefício da comunidade.


Porém, essa lei ainda não era tão acessível. Para participar, a ONG precisava ter o reconhecimento de organização de sociedade civil (OSCIP)


A democratização da lei


Entretanto, em razão das alterações geradas pela Lei nº 13.019/14, o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), atualmente são exigidos apenas os seguintes requisitos para utilizar este benefício:


  1. Ser entidade civil, sem fins lucrativos;
  2. Prestar serviços gratuitos em benefício de empregados da doadora, e respectivos dependentes, ou em benefício da comunidade onde atuem;
  3. Comprometer-se a aplicar integralmente os recursos na realização do objeto social, com indicação da pessoa física responsável pelo cumprimento;
  4. Não distribuir lucros, bonificações ou vantagens a dirigentes, mantenedores ou associados, sob nenhuma forma ou pretexto;
  5. Ser organização da sociedade civil, conforme definição da lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014;
  6. Cumprir os requisitos do artigo 3º, da Lei nº 9.790 de 23 de março de 1999 (finalidade do objetivo social), independente de certificação; e
  7. Não participar de campanhas de interesse político-partidário ou eleitorais, sob quaisquer meios ou forma.


Que ONGs podem usar essa lei?


Como dito acima, a lei de 2014 democratizou muito o acesso a esta lei de incentivo. Assim, se a sua ONG cumpre os sete requisitos acima – e provavelmente cumpre –, ela está apta a usar a lei em seu benefício.


Que empresas podem usar essa lei?


Um ponto muito importante: não são todas as empresas que podem utilizá-la.


Esta lei de incentivo só pode ser utilizada por pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real, forma de apuração de tributos obrigatória para empresas que faturam a partir de R$ 78.000.000 anualmente.


Ou seja, aquela empresa pequena do seu amigo ou o comércio do seu bairro provavelmente NÃO podem doar por meio deste benefício, pois têm o regime tributário SIMPLES ou de Lucro Presumido (esse assunto é um pouco complexo, mas a empresa com a qual você conversar saberá te dizer qual o regime tributário dela!).


Ah! E a empresa só terá abatimento de impostos se ela tiver que pagar impostos. Empresas tributadas por Lucro Real que não têm lucro não precisam pagar imposto de renda. Nesse caso, obviamente, ela não vai ter imposto a abater. 


Quantos % da doação a empresa pode abater?


Este é um outro ponto importantíssimo. A empresa que doar para você a partir desta lei de incentivo NÃO poderá abater 100% do valor doado dos seus impostos.


A empresa vai registrar a doação como despesa operacional, o que vai reduzir seu lucro e, por consequência, o total de imposto que ela precisará pagar (que é uma proporção do lucro). 

Essa dedução, por lei, é limitada a 34% para as empresas comerciais e 39% para instituições financeiras.


Um exemplo: uma empresa prevê pagar R$ 1 milhão de imposto de renda. Ela te doa R$ 100 mil e lança esta doação como “despesa”. A “despesa” diminui o lucro dela e o imposto devido, proporcional ao lucro. O imposto devido cai de R$ 1 milhão para até R$ 966 mil.


Resultado: ela te doou R$ 100 mil e teve um abatimento de R$ 34 mil, 34% do que doou. 

Como operacionalizar a doação?


As doações devem ser realizadas por transferência para a conta corrente da ONG, que precisa se comprometer mediante declaração expressa a aplicar os recursos nos seus fins sociais.

A ONG deve emitir Declaração conforme modelo exigido pela Receita na IN SRF nº 87/96, e não é preciso preencher o campo relativo ao Título de Utilidade Pública Federal.


Essa declaração deve ser arquivada pela empresa doadora, por no mínimo cinco anos, para fins de comprovação da dedução fiscal, caso necessário.


Depois, a empresa deve inserir esta doação como despesa operacional na sua declaração de imposto de renda.


O que eu devo fazer na prática?


Se você chegou aqui é porque REALMENTE quer usar esta lei.


Infelizmente, o cenário de leis de incentivo à doação no Brasil é complexo. Mesmo esta lei, feita para ser simples, carrega muitos desafios e exige certa força de vontade para ser compreendida.


Para tentar simplificar, apresento abaixo 6 passos para você utilizar o benefício sobre o qual falamos aqui:


1 – Confira se o seu estatuto preenche os sete requisitos apresentados pela Lei nº 13.019/14 (falamos sobre eles acima). Se sua organização não contemplar algum ponto, adeque o estatuto ou não siga com esta lei de incentivo. Sugiro pedir o parecer de um advogado neste passo, para ter certeza.


2 – Confira se a empresa que será doadora está enquadrada no regime tributário Lucro Real. Apesar de este não ser um assunto simples, a empresa saberá te responder. Se ela estiver em outro regime, automaticamente não pode participar.


3 – Confira se a empresa terá lucro. Se a empresa não tiver lucro contábil naquele ano, ela não deve pagar impostos. Se não pagar impostos, obviamente, não terá como abater a doação do imposto devido.


4 – Receba a doação. Esta é uma etapa simples. Basta a empresa fazer uma doação para a conta corrente da organização. Mas lembre-se: precisa ser a conta da organização, não de um indivíduo ligado a ela. 


5 - Emita a declaração. A declaração de recebimento do recurso precisa ser feita conforme modelo exigido pela RFB, constante na IN SRF nº 87/96. Não é preciso preencher o campo relativo ao Título de Utilidade Pública Federal.


6 – Fique em contato com a empresa para ajudá-la na declaração. Para evitar problemas do doador com a Receita Federal, o que poderia intimidar a doação nos anos seguintes, permaneça em contato para responder dúvidas. Instrua a empresa a permanecer com a declaração por cinco anos e se coloque sempre disponível para quaisquer perguntas.


Antes de encerrar o texto, uma última dica: busque um advogado ou contador para te assessorar nesta estratégia. Como disse algumas vezes aqui, leis de incentivo no Brasil são complexas. Uma assessoria especializada pode te ajudar muito!


Marcos Pinheiro  trabalha desde 2003 no terceiro setor. É diretor-executivo da consultoria Norte, Gerente do Instituto Escola Conectada e cofundador do Instituto Phi, atualmente uma das maiores instituições grantmakers independentes no Brasil. 


No Phi ocupou o cargo de Diretor de Relacionamento com Doadores, atuando na mobilização de quase R$ 50 milhões para 527 projetos sociais. Membro do Movimento por uma Cultura de Doação e do conselho do Dia de Doar, fez parte da rede internacional Wings, que se dedica à troca de experiências internacionais de mobilização de recursos. Ministrou palestras sobre mobilização de recursos em diversos estados do Brasil. 


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De acordo com o pesquisador brasileiro Ewerton Naves Dias, Ph.D em Psicologia pela Universidade do Porto, no Coping , consideramos o estresse como algo contextual, “o que significa que se trata de um processo de relação entre a pessoa e o ambiente e que se transforma ao longo do tempo. Desse modo, ele é definido como uma situação avaliada pelo indivíduo como significativa e com demandas que excedem seus recursos para lidar com o respectivo evento”. Diferente dos mecanismos de defesa, que acontecem de forma inconsciente, as estratégias de enfrentamento utilizam-se da percepção da pessoa frente ao evento estressor, desencadeando pensamentos avaliativos sobre suas ferramentas internas e externas e o controle ou não da situação, a fim de escolher sua forma de lidar com a situação. Categorias ou possibilidades de enfrentamento Apesar de Lazarus e Folkman definirem as duas principais categorias de enfrentamento, podemos encontrar na literatura algumas variações dessas estratégias, sendo as mais comuns: 1) Enfrentamento com foco no problema: Quando acredita-se que é possível alterar aspectos do ambiente, diminuindo ou eliminando os fatores de estresse e atuando de forma ativa. Alguns exemplos de ações, baseadas no contexto organizacional do Terceiro Setor, são: Análise crítica e detalhada do problema gerador de estresse Conversas individuais com pessoas que estão diretamente envolvidas na situação Conversas em grupo ou equipe, caso seja uma questão que influencie o bem-estar de várias pessoas Planejamento e criação de resoluções coletivas de enfrentamento ao problema Busca de apoio externo de especialistas 2) Enfrentamento com foco na emoção: Baseado na crença de que o ambiente é pouco alterável ou imutável, o indivíduo busca recursos para lidar com os sentimentos derivados do estresse, de forma a prolongar sua permanência na situação até que as circunstâncias mudem. Este é um tipo de enfrentamento moderado e pode ser realizado com: Fortalecimento de técnicas de autocontrole emocional Busca de apoio social (inclusive de colegas de equipe) ou psicológico para a descoberta de novas possibilidades de enfrentamento Investimento em hobbies ou atividades de lazer que minimizem os sentimentos negativos e promovam distração Desenvolvimento de práticas espirituais ou religiosas 3) Enfrentamento evitativo: Esta estratégia considerada passiva, também fundamentada na crença de que não há controle sobre as circunstâncias, engloba o afastamento, fuga, esquiva ou desligamento mental do problema. Aqui a pessoa escolhe evitar o conflito, lidar com os sintomas do estresse e economizar energia emocional. Qual estratégia usar? Os estudos que avaliam a predominância e a eficácia da utilização de cada tipo de coping divergem de acordo com o público pesquisado, considerando, no entanto, a variabilidade dos diferentes tipos de personalidade. Por exemplo: Uma análise feita com trabalhadores de CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) em Campinas (ZANATTA, 2019), verificou que a estratégia mais utilizada pelos profissionais destes espaços foi a de resolução de problemas, onde há a elaboração de planos de ação e alternativas com o objetivo de resolução da situação. Pesquisas realizadas com profissionais da saúde que trabalham em hospitais e analisadas pela Profª Drª Liliana Antoniolli (2022), afirmam que o coping mais utilizado pelas entrevistadas eram os baseados no enfrentamento com foco na emoção, onde empregavam um esforço cognitivo para ressignificar as experiências laborais “controlando emoções, como tristeza, medo e estresse, que emergem devido a situação conflitante”. Observa-se que a tendência de utilização de cada estratégia está positivamente ligada à experiência e idade dos profissionais, sendo que, quanto maiores mais o profissional tenderia a utilizar o enfrentamento com o foco no problema, enquanto os mais jovens tendem a escolher com mais frequência o afastamento (ou evitação) do estressor, por meio de um isolamento autoimposto. Outra proposta de estratégias de coping defendida pelo pesquisador Caryl Rubust (1988), da Vrije Universiteit em Amsterdã , Holanda , destacou outras quatro alternativas de enfrentamento, relacionadas ao ambiente de trabalho, que ele chamou de EVLN (Exit/Voice/Loyalty/Neglect), traduzido para o português como: saída, voz, lealdade e negligência. Nelas, o indivíduo escolheria: Saída: Sair do trabalho e encontrar um emprego melhor Voz: Tentar melhorar a situação conflitante com a sua voz Lealdade: Ser motivadas a apoiar ativamente a organização, ignorando seus incômodos Negligência: Concentrar-se em seus interesses não relacionados ao trabalho e "negligenciar" sua situação de trabalho insatisfatória De acordo com Lazarus e Folkman, as Estratégias de Enfrentamento ainda podem ser Adaptativas ou Desadaptativas, ou seja, quando as estratégias utilizadas são saudáveis e conseguem minimizar os sentimentos desagradáveis e desmotivadores são consideradas positivas/adaptativas. Em contraponto, quando não são saudáveis (recorrer a um vício como o cigarro, drogas ou bebidas alcoólicas, por exemplo) a estratégia é considerada negativa/desadaptativa. Como o Terceiro Setor tem lidado com os sintomas de estresse? Na “Pesquisa - A Saúde Mental e o Bem-Estar dos profissionais do Terceiro Setor ”, publicada pela Phomenta, em 2023, foram utilizados alguns questionamentos quanto às estratégias que as pessoas entrevistadas usavam para lidar com os sintomas de estresse oriundos do trabalho nas organizações sociais brasileiras, e encontramos nos resultados que: 69% relataram realizar atividades físicas 66% procuraram ajuda profissional de psicólogos, psiquiatras ou outros tipos de terapias alternativas 20% fazem uso regular de medicamentos calmantes e/ou ansiolíticos Percebemos com esses dados, que a maior parte das estratégias utilizadas pelos respondentes da pesquisa são do enfrentamento com foco na emoção, o que pode amenizar temporariamente a angústia e a desmotivação de quem passa por estresse de forma recorrente, mas que a médio prazo acaba gerando a saída deste colaborador, o que podemos observar nas altas taxas de rotatividade do setor. As Profª Drª Mary Sandra Carlotto e Sheila Gonçalves Câmara da Universidade Luterana do Brasil - ULBRA/Canoas, em suas pesquisas na área da educação, concordam com a constatação de que as estratégias de coping focadas no problema são estratégias adaptativas (positivas) que auxiliam os profissionais a enfrentar os problemas que surgem em seu ambiente organizacional. Elas também acrescentam que esse estilo de enfrentamento pode levar a um aumento dos níveis de realização profissional. Apesar de várias organizações sociais no Brasil relatarem, na Pesquisa da Phomenta (2023), que já estão implementando ações para amenizar os sintomas de estresse de seus colaboradores, como apoio psicológico, momentos de confraternização e lazer, formações e palestras, dentre outras, e estarem discutindo temáticas relacionadas à saúde mental e ao bem-estar, as mesmas ações precisam de coerência prática para realmente efetivar uma melhora da saúde coletiva. A publicação ressalta: “[...] é crucial que a organização não apenas introduza tais medidas, mas também promova mudanças que abordem os causadores de estresse, como o excesso de demanda e prazos apertados. A saúde mental não é apenas sobre discutir ou promover a conscientização, é também sobre criar um ambiente de trabalho sustentável onde os trabalhadores se sintam apoiados em suas rotinas diárias. Quando a liderança trabalha horas excessivas e perpetua um senso de urgência, por exemplo, isso pode enviar uma mensagem contraditória à equipe, sugerindo que, apesar das iniciativas de bem-estar, a cultura de trabalho exaustivo ainda prevalece”. Autoavaliação Como enfatizado no início do texto, o coping tem como característica principal a escolha consciente de sua reação frente ao estresse, o que nos leva a crer que para ser feita da forma mais eficaz, deve ser percebida, avaliada e monitorada com o passar do tempo. Dessa forma, faça agora uma autoavaliação de quais têm sido suas escolhas frente aos desafios do dia-a-dia, principalmente relacionados ao trabalho no Terceiro Setor. Avalie também quais têm sido as formas de enfrentamento utilizadas pelas pessoas em sua equipe ou em sua organização, para que se certifiquem de que por meio do apoio mútuo possam criar formas de lidar com o estresse enfrentando o problema. Referências Antoniolli, Liliana; Vega, Edwing Alberto Urrea Vega; Haack, Pâmela; Duarte, Andrey Godoy; Macedo, Andréia Barcellos Teixeira; Souza, Sônia Beatriz Cócaro de; Coping dos profissionais da enfermagem: revisão integrativa de literatura. Open Science Research - ISBN 978-65-5360-055-3 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 CARLOTTO, Mary Sandra; CÂMARA, Sheila Gonçalves. Síndrome de Burnout e estratégias de enfrentamento em professores de escolas públicas e privadas. Psicologia da Educação, vol. 26, n. 1, p. 29-46, 2008. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-69752008000100003 . Acesso em: 08 mar. 2023. DIAS, Ewerton Naves; PAIS-RIBEIRO, José Luís. O modelo de coping de Folkman e Lazarus: aspectos históricos e conceituais. Rev. Psicol. Saúde, Campo Grande , v. 11, n. 2, p. 55-66, ago. 2019 . Disponível em < http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2177-093X2019000200005&lng=pt&nrm=iso >. acessos em 10 mar. 2024. http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v11i2.642. Lazarus, R., & Folkman, S. (1984). Stress appraisal and coping. New York: Springer. PHOMENTA. Pesquisa: A saúde mental e o bem-estar dos trabalhadores do terceiro setor. Campinas: SP. 2023. Disponível em: https://www.phomenta.com.br/pesquisa-saude-mental-e-bem-estar RUSBULT, C. E.; FARREL, D.; ROGERS, G. e MAINOUS III, A. G. (1988), «Impact of exchange variables on exit, voice, loyalty and neglect: an integrative model of responses to declining satisfaction». Academy of Management Journal, vol. 31(3), pp. 599-627. Zanatta AB, Lucca SR, Sobral RC, Stephan C, Bandini M. Estresse e coping entre trabalhadores de centros de atenção psicossocial do interior do estado de São Paulo. Rev Bras Med Trab.2019;17(1) DOI:10.5327/Z1679443520190300:83-89 Coping: estratégias para enfrentar períodos estressantes ou Coping: mais saúde mental em períodos estressantes ou Coping, estratégias de saúde mental em períodos estressantes
Por Maria Cecília Prates   14 mar., 2024
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