Terceiro setor: 10 requisitos para uma organização começar bem

6 de outubro de 2022

Este conteúdo foi produzido por Maria Cecilia Prates

Dia desses, tive uma boa conversa com a fundadora e gestora de uma organização do terceiro setor. Ela me pareceu estar trilhando uma bem-sucedida trajetória, na área do microcrédito para empreendedores em áreas de vulnerabilidade social. Penso que casos como esse devem ser compartilhados, pois podem servir de inspiração e exemplo para gestores sociais em fase inicial de sua organização.


O relato: como começou a organização?


A nossa entrevistada é oriunda de família pobre do sertão da Bahia, “vivíamos em situação de grande vulnerabilidade. Viemos para Belo Horizonte (MG), eu e meus irmãos, em busca de trabalho e estudo e com o sonho de mudar a realidade social da nossa família. Vencemos, trabalhamos muito, estudamos muito, e realizamos os nossos sonhos… Foi daí que nasceu uma vontade enorme de ajudar as pessoas que sonham, que buscam e que não desistem.”


Em BH, ela fez faculdade de administração e atuou por mais de 27 anos como gerente de grandes bancos. Durante esse período, em 2006, incomodada com a situação do “nosso sistema bancário injusto, que destrói o pobre com as suas taxas de juros exorbitantes” e motivada pela leitura do livro ´Muhammad Yunus, o banqueiro dos pobres` escreveu o seu projeto social, com o foco justamente em “ajudar as pessoas desfavorecidas que vivem à margem do sistema financeiro”. Em seguida o guardou na gaveta, porque via que ainda não reunia as condições para implementá-lo. Mas o seu propósito continuou firme.


Anos depois, em 2013, abraçou forte a possibilidade de se inscrever em um ´Programa de desenvolvimento e capacitação para empreendedores sociais` do qual ouviu falar muito bem, e viu aí a possibilidade de desengavetar o seu (bem guardado) projeto. Ao longo daquele Programa, que durou 1 ano e meio, deu vida ao projeto: criou a organização sob o formato de “associação de crédito sem fins lucrativos”, montou a sua estrutura inicial de funcionamento, compatível com os poucos recursos de que dispunha. Sabia que o “seu voo” tinha que começar baixo, para que a organização fosse aos poucos ganhando musculatura…


Foi assim que, no final de 2015, o seu projeto social de microcrédito ficou pronto para deslanchar. Ela também sabia que teria o desafio de conciliar a sua nova função de empreendedora social com a atual função de ´consultora em gestão de investimentos e intermediação de negócios`, fonte do seu sustento e com certa complementaridade com o projeto social, além de mãe de 3 jovens. Mas, tinha consciência de que naquele momento o seu sonho já começava a virar realidade…..


De imediato, ela alocou R$ 10 mil de recursos próprios para o projeto, ou seja, para fazer face às despesas com a abertura da organização e para dar o pontapé inicial no capital a ser emprestado a título de microcrédito.

Até fevereiro de 2020 (início da pandemia, que foi quando ocorreu a nossa conversa), a nossa entrevistada contou que o projeto já havia entrado em 6 comunidades, em geral bairros pobres de BH, ou favelas, ou municípios de baixíssimo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) no entorno da capital mineira.


A dinâmica é a seguinte. Em cada um desses locais (um de cada vez), a entrada se dá por meio da aproximação com uma ONG da comunidade, ou com a associação de moradores, ou grupo religioso. Inicialmente é ministrado um curso de ´Educação financeira com empreendedorismo`. Logo a seguir, são identificados interesses e potenciais empreendedores, quando então são formados os grupos de 3 ou 4 ou 5 ou até no máximo 10 empreendedores.


Cada vez que é fechado um grupo de microempreendedores, a nossa gestora sai em busca de um ´investidor anjo`, que doa ou empresta o recurso (em torno de R$ 4 mil a R$ 5 mil) para cada grupo constituído. Em geral, esses investidores são seus amigos ou conhecidos do mercado financeiro, que se prontificam a fazer uma ação social. O “ticket médio” de empréstimo tem sido em torno de R$ 400,00 por empreendedor, em sua maioria para bordadeiras, artesãos, manicures, salão de beleza, doceiras /salgadeiras, costureiras, carrinhos de pipoca ou de churrasco, etc…. O aval (ou a garantia do empréstimo concedido) é sempre solidário, isto é, se um empreendedor do grupo ficar em dificuldades para o reembolso, os demais se comprometem a ir em seu socorro.


Outra linha de atuação nessas comunidades é a oferta de cursos de “Educação financeira pessoal” para crianças e adolescentes. Por exemplo, naquele momento (da entrevista) e em parceria com uma escola municipal de Belo Horizonte, a organização “está entrando” na favela da Pedreira Prado Lopes, uma das áreas de menor IDH da cidade. A intenção será oferecer curso de educação financeira para os alunos daquela escola pública, e atuar também na formação de grupos de empreendedores com os pais/responsáveis e a disponibilização do microcrédito para eles.


A essa altura, o leitor já deve estar se perguntando: de 2016 até hoje, quem constituiu a equipe da organização? Basicamente foi a nossa entrevistada (na condição de fundadora, gestora e animadora) e mais uma equipe de 10 voluntários. Aos voluntários cabe a missão de acompanhar de perto e apoiar na gestão dos negócios de cada grupo de empreendedores – até a devolução total do dinheiro emprestado. Ela e os voluntários se comunicam entre si por meio de grupo de WhatsApp, criado com essa finalidade.


Para finalizar a nossa conversa, perguntei à nossa entrevistada quais as dificuldades enfrentadas pelo projeto social até agora. Para ela, as três principais foram:


  • O projeto não conta com capital, ou funding. Se tivéssemos esse recurso próprio, isso nos permitiria permanecer na comunidade trabalhada – ou seja, “montar e manter uma microunidade na comunidade, com um agente de crédito local, e assim poder acompanhar o dia-a-dia dos empreendedores que já passaram pelo projeto e captar novos empreendedores”;


  • A busca por apoio de uma organização local para entrar na comunidade. Segundo ela, “por incrível que pareça, há sempre vários interesses em jogo, rivalidades entre as próprias organizações da comunidade, e muitas questões políticas envolvidas. Mesmo querendo ajudar a comunidade por meio do microcrédito, muitas vezes somos percebidos como ameaça ao equilíbrio do poder local.”;


  • Só poder contar com o trabalho voluntário. Por mais engajadas que os voluntários sejam, muitas vezes eles acabam faltando aos compromissos assumidos. “É complicado só contar com trabalho voluntário….”.


A seguir, indaguei à nossa entrevistada se ela teria evidências de que o seu trabalho social estaria no caminho certo. Ela foi firme em afirmar que, para cada comunidade apoiada, ela dispõe de indicadores fim, do tipo negócios impulsionados e renda gerada; e também de indicadores meio, como parcerias e recursos atraídos.


Além disso, ela estava também muito empolgada pois acabara de passar por um rigoroso crivo de um banco de desenvolvimento e tinha começado a ser “incubada” com a perspectiva de, inicialmente, conseguir apoiadores financeiros de fôlego. Mais para a frente (daqui a uns dois anos), a sua ideia é se transformar em uma fintech social. Dessa maneira, ela irá conseguir dar escalabilidade ao seu sonho do microcrédito para empreendedores de baixa renda que não conseguem ter acesso ao sistema de crédito dos bancos – nem junto aos tradicionais, nem aos digitais. E não mais ficar restrita a beneficiar algumas poucas comunidades em BH.


O aprendizado: quais são os pré-requisitos?


Dessa conversa com a nossa gestora social, destaco algumas qualidades e pré-requisitos que consegui detectar nessa fase inicial da OSC (organização da sociedade civil) fundada por ela, que me pareceu estar indo muito bem.


1. Motivação forte. Ter um sonho – Por conta do seu passado de menina pobre, a nossa entrevistada alimentou com muita garra o seu desejo de contribuir para um futuro melhor de crianças que, como ela, nascem em um ambiente inóspito e sem oportunidades.


2. Sintonia com o core-business – O foco do projeto social teve sintonia estreita com a área profissional e de competência de sua idealizadora. Veja que ela buscou ficar antenada para identificar possibilidades de impacto social no seu campo de atuação (que é o financeiro), o que ocorreu a partir da leitura do livro do Muhammad Yunus.


3. Persistência – O desenho inicial do projeto social ocorreu em 2006. Tempos depois, em 2013, agarrou, com unhas e dentes, a oportunidade de aprimorá-lo. A implantação do projeto social, via organização do terceiro setor, se deu em 2015. De 2016 a 2019, e de modo cauteloso, foram sendo atendidas algumas comunidades alvo do projeto. No final de 2019, já quase 14 anos depois, surgiu nova oportunidade de aprimoramento do projeto, agora com chance de escalabilidade.


4. Uso parcimonioso das doações – Nesses anos de funcionamento, a nossa entrevistada procurou usar sempre os recursos financeiros conseguidos [ou via doação, ou empréstimo] nas atividades-fim do projeto – microcrédito para os empreendedores. Ou seja, ela procurou fazer a organização girar da forma menos onerosa possível. Note-se que geralmente o investidor (financiador) social não se sente atraído a empatar o seu capital em ativos imobilizados e/ou atividades meio, a não ser em casos imprescindíveis para garantir o funcionamento da organização.


5. Não à autor-remuneração – Como visto, a nossa entrevistada assumiu o seu papel de empreendedora social em paralelo com as suas outras atribuições (garantidoras do seu sustento). Sobretudo em se tratando de organizações do terceiro setor em fase inicial de funcionamento, o fundador não deve buscar inserir desde já, nas despesas da organização, o seu pró-labore de modo a lhe garantir o mesmo padrão de vida de antes, ou até melhor. Nessa fase piloto, é saudável e gera credibilidade o fato de o fundador/idealizador da organização ser percebido como co-partícipe nos riscos da iniciativa social – no nosso caso, a nossa entrevistada doou, além de capital próprio, o seu tempo e experiência.


Lembramos que esta é uma escolha do empreendedor(a) de ONG. Caso ela ou ele deseje, não há impedimentos legais para que dirigentes de organizações da sociedade civil sejam remunerados.


6. Sim à mão de obra voluntária – Sem dúvida, é muito melhor para a organização social poder contar, desde o início, com uma equipe competente e especialmente contratada. Mas, quem trabalha no terceiro setor sabe muito bem como é difícil conseguir mobilizar recursos para financiar mão de obra, ainda mais quando os projetos sociais ainda estão começando, sem garantias de que vai mesmo conseguir avançar. Por isto, e como fez a nossa gestora, é importante saber atrair voluntários para trabalharem no projeto – ou seja, pessoas que já sejam comprometidas com a causa, ou com a comunidade, ou que queiram de fato ajudar. Ela própria deu o treinamento para os 10 voluntários; e depois seguiu contando apenas com eles que, apesar de comprometidos com o projeto, nem sempre podem estar presentes e disponíveis.


7. Parceria sempre com organizações da comunidade – Apesar das dificuldades relatadas por nossa entrevistada com relação à aproximação com as organizações das comunidades, ter essas parcerias é imprescindível para a iniciativa deslanchar bem. Mesmo em casos em que o idealizador do projeto seja da própria comunidade, e que a intenção do projeto seja beneficiá-la, dificilmente a iniciativa vai conseguir deslanchar se não houver um real envolvimento de outras instituições e/ou lideranças da comunidade com o projeto. Pois se o projeto é percebido como caindo de paraquedas na comunidade, ou as pessoas ficam desconfiadas e não se aproximam, ou ´o que` está sendo oferecido raramente consegue atender de modo adequado à demanda local.


8. Avançar gradualmente – Diferente do que ocorre nas organizações lucrativas (e aqui incluo as startups de impacto social), em que a possibilidade do lucro funciona como grande atrativo para os investidores, nas organizações sem fins lucrativos o que atrai os investidores é a possibilidade de produzir transformação social. No caso da nossa entrevistada, vimos como ela foi gradualmente amadurecendo o seu sonho, depois começou pequeno a colocá-lo em prática , foi amadurecendo a experiência e atraindo pequenos investidores sociais, e agora o seu projeto já está com chances de se tornar atraente para investidores maiores. No terceiro setor, há que se ter paciência para alcançar as metas; não se pode querer queimar etapas, sob pena de fracasso certo.


9. Ter indicadores de acompanhamento – Ter maneiras tangíveis e confiáveis para acompanhar e demonstrar a diferença que o projeto social está fazendo na vida dos seus beneficiários é a principal dica para conseguir apoiadores para o projeto social – sejam eles colaboradores, investidores, doadores e parceiros em geral. Se o gestor responsável não consegue apresentar evidências de avanços e resultados sociais, começam a pairar dúvidas quanto à capacidade e efetividade da iniciativa. Daí porque, segundo a nossa entrevistada, para cada apoiador conquistado para uma ação na comunidade, ela se apressa em encaminhar as métricas de acompanhamento. Que podem ser poucas, mas o fundamental é que informem sobre o que está sendo realmente realizado e alcançado.


10. Ir aos poucos construindo o networking de investidores sociais – No relato vimos como a nossa gestora social foi aos poucos construindo e ampliando a rede de investidores para o projeto social, partindo dos seus contatos pessoais. E não basta ampliar o número de investidores, é preciso também ir fidelizando esses investidores, mediante a prestação de contas. Além disso, por mais que ela continue avançando rumo a investidores maiores, vale aqui também a regra de ouro da diversificação (válida para os investimentos / aplicações em geral), que é a de não deixar a iniciativa social dependente de apenas um ou muito poucos financiadores, sob pena de fragilizar a autonomia da organização.


Concluo com um pensamento do filósofo grego Aristóteles, “o começo parece ser muito mais do que a metade do todo”. Ou seja, podemos dizer que entendendo como foi a fase inicial de uma organização social, seremos capazes de prever (com baixa margem de erro) a sua capacidade em vir a ser uma organização sólida e sustentável e produzir os resultados sociais pretendidos.




Maria Cecília Prates é economista e mestre em economia pela UFMG, e doutora em administração pela FGV /Ebape (RJ). A área social sempre foi o foco de suas pesquisas durante o período em que esteve como pesquisadora na FGV, e depois em seus trabalhos de monitoria, consultoria, pesquisa e voluntariado. 


Contato: mcecilia@estrategiasocial.com.br.


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Em projetos sociais os resultados estão quase sempre associados a resultados intangíveis, subjetivos e abstratos, como por exemplo: crianças saudáveis, adolescentes com autoconfiança, autoestima de idosos, jovens capacitados para o mercado de trabalho, comunidade engajada, famílias ajustadas, empreendedores bem-sucedidos, e por aí vai… Alcançar esses resultados intermediários são etapas necessárias e imprescindíveis que vão contribuir para o alcance do impacto final pretendido de transformação na vida das pessoas atendidas. O problema é que até hoje no Brasil ainda não se tem clareza metodológica sobre como medir esses conceitos tão amplamente adotados na área social, que seja confiável e capaz de captar (ser sensível a) os avanços conseguidos . Então, se não há essa clareza – e aqui me refiro sobretudo à grande maioria das organizações do terceiro setor – como conseguir PLANEJAR bem os projetos sociais? Ou seja, como explicitar O QUE queremos mudar? E como saber depois se o que fizemos conseguiu, de fato, chegar AONDE queríamos, ou seja, AVALIAR se as iniciativas conduzidas foram válidas, eficazes e eficientes? Medição compartilhada: uma prática que deveria ganhar força no Brasil No Reino Unido e EUA desde 2003 – No Reino Unido vêm sendo envidados esforços por organizações think-tanks (como a New Philanthropy Capital – NPC , ou a Triangle /Outcomes Star ) e nos Estados Unidos ( FSG) para construírem sistemas de indicadores “de prateleira” (do inglês, off-the-shelf tools ) que possam ser compartilhados por organizações do terceiro setor ( charities or NGOs – Non-Governmaental Organisations ). No Reino Unido, organizações sociais trabalhando em uma mesma área-fim (por exemplo, educação de adolescentes em situação de vulnerabilidade) foram se unindo, capitaneadas por alguma organização think-tank como a NPC, para desenvolverem um sistema comum de avaliação de resultados. Nesse sentido, os conceitos abstratos relacionados a objetivos de resultados (por exemplo: autoestima), adotados por organizações trabalhando com públicos semelhantes, foram sendo operacionalizados nos mesmos indicadores ou escalas. Feita a operacionalização dos conceitos, as demais ferramentas para medição também começaram a ser desenvolvidas em comum, através do apoio de uma equipe especializada, tais como a construção dos questionários, a estratégia para a sua aplicação, o sistema de base de dados (que pode ser online ) e o referencial para análise dos dados coletados. No Brasil, no período em que atuei (2011 – 2016) no Programa da POS (Parceria com Organizações Sociais) da Fundação Dom Cabral – FDC (hoje denominado Pilaris ), quis começar a difundir essa ideia das ferramentas de prateleira ( Avaliação de projetos sociais no terceiro setor: uma agenda em construção , seção IV), mas percebi que o terreno precisava antes ser melhor trabalhado. 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Para ilustrar melhor a ideia, aqui estão alguns exemplos de instrumentos incluídos no Manual: Conceito: autoestima (escala de Rosenberg), pág. 40-42 do Manual Conceito: impulsividade de adolescentes (escala de Barrat), p.66 Conceito: ser cuidadoso com o meio-ambiente / Avaliação de projeto de apicultura (pág. 67-68) Conceito: bem-estar de crianças e adolescentes, entre 11-16 anos (NPC), Pág. 197-205 Marco lógico: projeto de qualificação digital, Instituto Ramacrisna (pág. 207-210) Questionário: Preparação de jovens (16-18 anos) para inserção no mercado de trabalho, Associação Projeto Providência (pág. 226 – 230) A intenção de compartilhar esses instrumentos no Manual foi oferecer inspiração e facilitar o trabalho de planejamento e avaliação em organizações que atuam com projetos sociais semelhantes, ajudando, assim, a “queimar etapas” e avançar com mais agilidade nesse processo. Medição compartilhada: o caso da ferramenta Outcomes Star Como surgiu? Outcomes Star (traduzido ao pé da letra: Estrela de Resultados) é uma ferramenta para medir e apoiar as mudanças / resultados, que foi criada e desenvolvida pela Triangle Consulting Social Enterprise do Reino Unido . A Triangle, fundada em 2003, se define como “ uma empresa inovadora, guiada por uma missão social que é a de apoiar os provedores de serviços sociais a transformarem vidas de pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade social, traumas, deficiências ou doenças, por meio da criação e o uso correto de ferramentas que engajem e promovam abordagem facilitadoras ”. A primeira versão do Outcomes Star começou como uma demanda (em 2003) da St Mungo`s, uma organização social voltada para o atendimento de moradores de rua, que queria avaliar os resultados do seu trabalho. A ferramenta acabou ganhando tração a partir da constatação de sua aplicabilidade também junto a outras organizações do Reino Unido que atendiam moradores de rua. 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A boa gestão age diretamente sobre cada uma delas para transformar desafios em oportunidades: Na conversa do tipo “O que aconteceu?”, os participantes focam em quem está certo ou errado, partindo de suposições que levam ao ciclo de acusações e impedem a solução. Conforme o autor: “quando algo desagradável acontece, o foco da conversa gira em torno de quem está certo, quem está errado, quem disse o quê, quem deve assumir a responsabilidade e assim por diante. Passamos a discutir quase todos os detalhes.”. Exemplo de conflito – Projeto atrasado e disputa de culpa: ao desenhar a festa junina da organização, ficou faltando definir quem compraria e arrecadaria as prendas das barracas, gerando muito estresse no dia da festa. Logo, membros começaram a atribuir culpa uns aos outros: “Foi o time das coordenadoras”; “Não, foram vocês que não passaram direitos”; “Não me envolvam, eu fiz minha parte”. 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Ao promover a compreensão mútua, o compartilhamento de responsabilidades e a resolução construtiva de conflitos, a gestão não apenas soluciona problemas de forma mais eficaz, mas também fortalece mais as equipes, aumenta a produtividade e cultiva uma cultura de confiança e resiliência. Dessa forma, as conversas difíceis se tornam oportunidades para aprendizado e crescimento, em vez de fontes de conflito e estagnação. Gostou do conteúdo? A Phomenta está realizando um mapeamento e quer saber como o terceiro setor está gerindo pessoas e conflitos em suas organizações. Compartilhe sua experiência e contribua com este estudo acessando: [link] Artigo realizado com apoio da ferramenta de IA Notebooklm e do livro Conversas difíceis - Douglas Stone, Bruce Patton e Sheila Heen 
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Guia prático que ensina como estruturar uma página de captação de doações para ONGs: mensagem clara, métricas de impacto, transparência financeira e CTA que converte. Saiba mais!
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Inicialmente, vamos entender melhor o que são métricas? Métricas são números e dados que as redes sociais fornecem para mostrar o desempenho das publicações feitas por você ou pela sua ONG. Quando você publica algo no Facebook ou Instagram, essas redes sociais mostram quantas pessoas visualizaram, curtiram, comentaram ou compartilharam seu conteúdo. Saber interpretar essas informações é muito importante porque ajuda a sua OSC a entender o que está dando certo e o que pode melhorar na comunicação com o público. Ao entender melhor essas informações, você pode criar conteúdos que alcançam mais pessoas e ajudam sua organização a ter um impacto maior. Quais são as métricas mais importantes? Entender as principais métricas pode parecer difícil no começo, mas conhecendo cada uma delas fica muito mais fácil saber se sua comunicação está indo bem. Cada uma dessas métricas traz informações cruciais que ajudam a entender o comportamento do seu público e como melhorar as publicações da sua organização. Desvendando as siglas e abreviações das métricas CTR (Click Through Rate): porcentagem de pessoas que clicaram em um link após visualizá-lo. CPM (Custo por Mil Impressões): quanto custa mostrar seu conteúdo para mil pessoas. CPC (Custo por Clique): quanto você paga por cada clique no seu conteúdo. CPA (Custo por Aquisição): custo médio para que uma pessoa realize uma ação específica, como fazer uma doação. ROI (Return on Investment): retorno financeiro obtido em relação ao dinheiro investido em publicidade ou campanhas. KPI (Indicador-Chave de Desempenho): métricas específicas escolhidas para medir o sucesso das suas ações. Alcance e Impressões O alcance é o número de pessoas diferentes que viram sua publicação pelo menos uma vez. Quanto maior o alcance, mais pessoas diferentes foram alcançadas pelo seu conteúdo. Já as impressões mostram quantas vezes sua publicação apareceu nas telas das pessoas, contando inclusive aquelas que viram mais de uma vez (FERREIRA; OLIVEIRA, 2015). Engajamento Engajamento é uma das métricas mais importantes porque mostra como as pessoas estão interagindo com seu conteúdo. Essas interações incluem curtidas, comentários, compartilhamentos e salvamentos. Um alto engajamento significa que as pessoas realmente gostaram do seu conteúdo e tiveram vontade de interagir com ele. Quanto mais engajamento, melhor você está se comunicando com o seu público (FERREIRA; OLIVEIRA, 2015). Cliques Cliques mostram quantas pessoas clicaram no seu conteúdo ou nos links que você compartilhou. Essa métrica é especialmente importante quando você quer direcionar as pessoas para seu site ou para alguma ação específica, como um evento ou uma campanha de doação (COSTA, 2020). Crescimento de seguidores Essa métrica mostra quantas pessoas novas começaram a seguir sua ONG depois de ver suas publicações. Um crescimento constante de seguidores significa que você está conseguindo chamar a atenção e conquistar novas pessoas para sua causa (COSTA, 2020). Mas afinal, como essas métricas se relacionam? É muito importante não olhar apenas para uma métrica isoladamente. Por exemplo, se muitas pessoas veem sua publicação (alto alcance), mas poucas interagem com ela (baixo engajamento), pode ser que o conteúdo não esteja interessante o suficiente. Para entender se sua estratégia está funcionando, você precisa analisar diferentes métricas juntas, como alcance, engajamento e cliques. Isso ajuda a ter uma visão mais completa do desempenho das publicações (GOMES, 2018). Tipos de análises que você pode fazer Para usar bem as métricas, você pode fazer vários tipos diferentes de análises. Cada tipo serve para algo específico e ajuda você a entender melhor o desempenho das suas redes sociais, mostrando caminhos para melhorar sua comunicação. Análise simples A análise simples é a mais básica e mostra diretamente quantas pessoas viram ou interagiram com seu conteúdo (RECUERO, 2014). Comparação A análise comparativa é quando você compara resultados de diferentes publicações ou períodos. Por exemplo, você pode comparar o desempenho das publicações deste mês com as do mês passado para entender o que funcionou melhor e planejar conteúdos futuros (RECUERO, 2014). Previsão A análise preditiva usa dados antigos para tentar prever resultados futuros (RECUERO, 2014). Um exemplo é que se sabemos que entre novembro e dezembro há um aumento nas curtidas em posts relacionados a doações, construir conteúdo que fale sobre isso antecipadamente é uma forma de “prever” a procura e antecipar-se ao aumento de demanda. Redes sociais Analisar as redes sociais significa entender como as pessoas interagem umas com as outras no seu perfil ou página. Você pode descobrir quem são os principais seguidores, quais conteúdos são mais compartilhados e como essas conexões ajudam a espalhar sua mensagem para mais pessoas (GOMES, 2018). O que ter cuidado ao analisar os números? Ao analisar as métricas, você precisa levar em conta fatores externos que podem influenciar os resultados. Datas especiais, feriados ou eventos importantes podem aumentar ou diminuir a interação com suas publicações (as chamadas datas sazonais). Por isso, sempre olhe com cuidado e verifique se os dados são realmente representativos do desempenho geral (KAHNEMAN, 2012), todo o contexto deve ser levado em conta. Cuidado com erros ao analisar Existem alguns erros comuns ao analisar as métricas. Um deles é o viés de confirmação, que acontece quando você só presta atenção nos números que reforçam o que você já acredita. Outro erro é o viés de recência, que acontece quando você só leva em conta os resultados mais recentes, esquecendo resultados passados (KAHNEMAN, 2012). Como já dito. Recomendações O conteúdo do artigo foi baseado no conhecimento da autora e com referências de base científica. Caso você deseje ampliar o conhecimento acerca da temática, recomenda-se a leitura das fontes a seguir: COSTA, Felipe. Aplicação estratégica de métricas digitais. Panorama, Goiânia, v. 9, n. 2, p. 45-60, 2020. FERREIRA, Mariana; OLIVEIRA, Ana. Produção textual e interações sociais em plataformas digitais. Revista Comunicando, Lisboa, v. 5, n. 1, p. 10-23, 2015. GOMES, André. Dinâmicas de interações nas redes sociais digitais. Salvador: UFBA, 2018. KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: duas formas de pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012. RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2014. 
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